Descubra a pessoa e saberá lidar com a demência
Os cuidadores formais de uma pessoa com demência têm, nos dias que correm, de se focar na pessoa, na sua história de vida, na sua personalidade, preferências, sensibilidade. Têm de saber o que lhe dá prazer e o que lhe causa medo, o que a faz rir e chorar.
O ser humano tem a tendência natural de catalogar, classificar, guardar em “gavetas” o que vê, o que sente e até as pessoas com quem se cruza. É uma forma de aliviar o peso do constante fluxo de informação que recebemos e com o qual temos de lidar. Esta tendência conduz-nos a generalizações erróneas, a preconceitos e a injustiças que se reflectem nos vários sectores da nossa vida.
Esta natural tendência para a classificação, que nos tolda a visão a todos, é especialmente perigosa no caso dos profissionais de saúde. A forma como estes profissionais encaram os doentes é também toldada, ao ponto de se confundir a doença com a pessoa. A pessoa é um diagnóstico, ou na melhor das hipóteses um caso: um AVC, um melanoma, uma demência…
Poder-se-á afirmar que se trata apenas de uma questão de linguagem, e que é mais prático para quem está sobrecarregado com demasiados pacientes. Porém, muitas vezes o problema vai bem mais longe. A verdade é que nem sempre temos a disponibilidade para saber, ou mesmo querer saber, quem é aquela pessoa. Como se bastasse conhecer o diagnóstico para poder intervir. Como se não tivessem qualquer influência os aspectos emocionais, o contexto de vida, o ambiente em que se encontra, os familiares que a cuidam, entre muitos outros aspectos.
Esta situação é grave seja qual for o diagnóstico, mas no caso das demências, em que a identidade da pessoa se está a perder, é determinante. Os cuidadores formais de uma pessoa com demência têm, nos dias que correm, de se focar na pessoa, na sua história de vida, na sua personalidade, preferências, sensibilidade. Têm de saber o que lhe dá prazer e o que lhe causa medo, o que a faz rir e chorar.
Se trabalha diariamente com uma pessoa com demência e não a conhece profundamente, se não sabe qual o tom de voz a que é mais receptiva, qual a temperatura da água do banho que prefere, de que tipo de música gosta, se tem medo de trovoada, quais as suas “manias” e por que razão surgiram… então poderá estar a cuidar dessa pessoa com o foco na patologia em vez de na pessoa.
É preciso termos a coragem de dizer que o trabalho que está a ser feito não é suficiente, que há espaço para melhorar. Cabe aos profissionais e às instituições de saúde procurar conhecer e aplicar os princípios da abordagem centrada na pessoa com demência. A informação está disponível. Há que acabar com a falta de preparação que por vezes ainda se encontra em Portugal.
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